Meio-dia de uma ensolarada
segunda-feira no Rio de Janeiro; mais precisamente, dia sete de janeiro. Este
era o momento exato em que Cláudia começou a preparar o almoço. Mesmo atarefada com o prato do dia – afinal,
a dúvida era se começava a ralar a cenoura ou a cozinhar o feijão –, ela notou
e estranhou o fato do filho João Carlos não ter acordado desde então. Certo que era
temporada de férias e ele realmente precisava descansar – afinal, seu ano
anterior foi bem puxado por conta do vestibular –, mas o menino nunca foi de
levantar muito tarde.
– Bom dia, mãe. – logo se ouviu a
voz sonolenta de João ecoando pela cozinha. Sua aparência aparentava cansaço.
– Finalmente, hein, filho? O que
houve?
– Ah... Eu fiquei acordado até
tarde ontem por causa do Sisu.
Ao ouvir a frase, Cláudia entrou
em pânico.
– Como é?! Por que não me contou
antes?
– Ué... – João estranhou um pouco
o elevado tom de voz utilizado pela mãe, demonstrando surpresa – ontem foi o
primeiro dia.
– Ai, João! – Cláudia respirou
fundo – Podia ter me acordado!
João riu um pouco do modo como a
mãe estava.
– Não precisava.
– Como você 'tá se sentindo?
– 'Tô normal, mãe... Logo essa
fase passa.
Ela novamente aumentou o tom de
voz, transmitindo ainda mais irritação:
– Como você pode ser tão otimista
com isso?!
– Graças a Deus que eu sou
otimista, né? – João devolveu a resposta, ainda achando tudo mais estranho. A
mãe sempre o apoiara e ele realmente não entendeu o motivo dela ter agido dessa
forma. As mães pegam as dores dos filhos, mas não precisava ser tanto assim por
conta do vestibular!
– Ai, João... Eu não sei, isso
não pode ser resolvido tão tarde assim...
– Relaxa. Hoje é segunda-feira,
tenho até sexta para ver isso do Sisu com calma.
– Até sexta? É muito tempo! Não
acha que vai piorar?
– Piorar vai sim, mas faz parte,
só me resta esperar.
– Bom, se você diz... – Cláudia não
entendeu o motivo da espera do filho, mas demonstrou mais calma – vou continuar
a preparar o almoço, mas pelo visto, já sei que terá que ser uma comida mais
leve pro senhor.
“Ela ta se preocupando tanto
assim com isso que quer até que eu coma algo mais leve? O que seria mais leve?
Salada?”
– Eu não quero salada, mãe! Aí
sim que eu vou ficar ainda mais ansioso e nervoso com o que tá acontecendo.
Prepara aí um bife com batata-frita.
– Bife com batata-frita? Você
enlouqueceu, João? Vamos combinar que você já 'tá meio acima do peso, quer ficar
com ainda mais dor de dente?
– Você é tão legal! Obrigado
mesmo pela parte que me toca e... Peraí,
você disse “ainda mais dor de dente”?
– Claro! Foi o que você me disse!
– Quê? Mãe, você 'tá bem?
– Claro que eu 'tô bem, João
Carlos! Que pergunta besta!
– Eu não falei nada de dor de
dente.
– Acho que quem não tá bem é
você... Ficou falando aí que ficou acordado até tarde por causa do siso... 'Tá doendo muito? 'Tá delirando de dor, é isso?
Naquele momento, João começou a
rir, deixando a mãe ainda mais nervosa.
– Por que você 'tá rindo, João
Carlos?! Tenho cara de palhaça?
– MÃE! – ele disse ainda rindo
mais. Não tinha nem ideia de como a mãe era exagerada e até meio grossa, vamos
combinar – Eu não estou com dor de dente, nem meu siso nasceu! Eu estava
falando do Sisu, que significa Sistema de Seleção Unificada. É um site onde o
estudante que prestou o ENEM escolhe duas opções de curso em qualquer faculdade
pública de qualquer estado do país, desde que essa tenha aderido ao ENEM.
Dependendo da nota de corte do candidato, ele vê por meio da nota de corte do
curso, que é gerada através de quantas pessoas também se candidataram para
aquele curso com aquele número de vagas, se pode passar ou não. E isso é
atualizado às duas da manhã todos os dias, até sexta-feira.
Cláudia, até então tensa, respirou aliviada.
– Ahhhh! Viu só como fica mais
claro quando você me explica?
– Você não tinha nem
perguntado... Mas pensando bem, mãe, até que você 'tá certa em uma coisa.
– Em quê?
– Sisu bem que combina com siso
mesmo. Ambos são chatos, incomodam, nos deixam nervosos... Acho que o Sisu, no
fundo, ganhou esse nome por ser uma tremenda dor de dente.
– Você é tão bobo, João... –
Cláudia riu com a analogia do filho, sendo seguida por ele – Se
depender da explicação gigante que você me deu, tenho certeza de que você passa
para o que você quiser.
João Carlos,
tendo o pai morando no interior do Paraná, resolveu cursar Engenharia por lá.
Deixou a mãe morrendo de saudades e de preocupação em como seria a vida do
filho sem ela por perto. Um pouco antes dele ir para a sala de embarque do
aeroporto, ela disse: “Vê se vai ao dentista regularmente!”.
Resultado: um
mês depois, começava a nascer o siso de João.
quarta-feira, 9 de janeiro de 2013
sábado, 5 de janeiro de 2013
A mais poderosa influência
[escrito e originalmente postado na comunidade do orkut "Escritores - Fakes" em 05 de junho de 2010; editado em 05 de janeiro de 2013]
– Com licença, senhor Coração?
– Com licença, senhor Coração?
– Eu mesmo, jovem. O que desejas?
Era inacreditável. Depois de tanto tempo, eu estava cara a
cara com ele, o todo poderoso do sistema vital. Foram inúmeras tentativas de
chegar perto, todas elas fracassadas. Mas, finalmente, eu estava ali.
Modéstia à parte, fiz um bom trabalho driblando os
seguranças, que cercavam a entrada do tão temido local.
– Nossa... É muito estranho estar aqui, tão perto do senhor.
Ele me olhou de cima a baixo, contendo certa incerteza em
seu olhar.
– Por acaso o jovem não é nenhum terrorista, certo? Já
tentaram me atacar uma vez, quase parei de exercer minha função.
Nunca imaginei ver o poderoso chefão com medo de... mim. Não
sou inofensivo, confesso. Mas a minha aparência é tão boa e tão leve, não assusta
ninguém. Vê–lo ali, prestes a me expulsar de seu canto, me fez sentir superior.
Com todo o respeito.
– Medo? Senhor, não precisa ter medo. Não sou terrorista. Só
gostaria de lhe pedir um favor.
– Então que seja rápido. Estou muito ocupado no momento, trabalhar
sozinho não é nada fácil.
Era exatamente aquilo o que eu precisava ouvir para meu dia
melhorar.
– Exatamente isso que eu gostaria de lhe perguntar. Eu sei
que isso parece medonho, vindo de um estranho como eu. Eu posso trabalhar com o
senhor?
Lembro até hoje do temor que o senhor Coração sentiu. Até
então calmo, ele começou a movimentar–se centenas de vezes mais, o que me fez
sentir bem. Eu estava provocando sensações não só nele, como no ser humano o
qual penetrei seu corpo.
Os tais movimentos eram as famosas "batidas". O
emprego do senhor Coração, que garante a vida do tal ser humano. Eu estava
prestes a piorar ou melhorar a sua vida.
Uau, eu ter esse poder dentro de alguém? Eu sou muito
importante mesmo.
– Eu sei exatamente o que você quer. Saia daqui.
As palavras, ditas tão friamente pelo Coração, me fizeram
desistir por uma fração de segundo.
Apenas uma fração.
– Então o que eu quero?
– Mudar a vida da pessoa para qual eu trabalho. Isso não é
nobre, não é correto.
É, ele sabia bem.
– Achei que o senhor concordasse comigo. Não vê que este ser
humano está precisando de mais emoção? Não acha que, por bem ou por mal, isso
não vai mudar sua forma de ver e de viver a vida? Por favor, senhor Coração. Eu
sou o mais puro sentimento que nutre dentro de alguém. Somente o senhor pode
colaborar comigo.
O vi suspirar e voltar ao normal. Quando pensei que ele
fosse hesitar novamente, ele me fez uma ordem:
– Aproxime-se.
E lá fui eu, quebrando todas as barreiras que tinha
enfrentado para estar ali. Eu o tinha convencido. A hora era aquela.
Novamente, as batidas aceleraram–se. Eu sabia exatamente o
poder que estava tendo sobre ele e sobre o ser humano, prestes a cair em uma
armadilha tão esperada como eu.
– Qual é seu nome, meu jovem?
– Amor.
Quando terminei de pronunciar a última sílaba, as batidas já
eram frenéticas. Aquilo era, definitivamente, um "sim".
Tanto que estou até hoje aqui, trabalhando junto com o
senhor Coração. Sobre o ser humano o qual invadi? Sim, a sua vida mudou. Não
sei se para melhor ou para pior; mas sei que estou sabendo exercer bem a minha
função.
Uma breve apresentação
Confesso que tive uma ideia totalmente diferente ao (tentar)
começar um blog. No auge da loucura que me bateu à porta numa tarde chuvosa,
pensei, tadinha, inocentemente, naquele clima de ano novo, vida nova: "Vou
começar um blog e minha meta será escrever uma crônica por dia, até o final do
ano". Hahaha! Comentei a ideia com algumas pessoas que me apoiaram (mas,
no fundo, suspeito que tenham pensado o quão maluca fui), e pensei em engatar a
ideia. Criei até um piloto, firme e forte na decisão. Desisti antes de começar.
Já andava enferrujada para criar novas estórias, situações e contos, como eu
mudaria isso do nada? E, pior, aonde eu arrumaria inspiração para inventar uma
crônica por DIA? Acho que exagerei um pouquinho.
Entretanto, criar um blog com os meus escritos – sejam antigos ou recentes – já estava em meus planos há um tempo. Por receio, não o fiz antes. Sabe-se lá que receio era esse! Mas achei que já era hora de por a timidez de lado e expôr – mesmo que de forma metafórica na maioria das vezes – meus pensamentos. Visões, inspirações, ou seja lá outros "ões" que aqui se encaixam.
E cá estou eu. Não sou um primórdio da literatura, tampouco uma maravilha da modernidade, mas a gente faz o que pode, certo? O meu ponto de partida é compartilhar o que escrevo (ou o que tento escrever); sejam crônicas, contos, ou meu almoço do dia. Não, mentira, isso não (a não ser que dê - obrigada, Carol linda - em algo...). Bom, o que vem a partir daí, deixa que o tempo toma conta. E que sejam bons frutos!
Entretanto, criar um blog com os meus escritos – sejam antigos ou recentes – já estava em meus planos há um tempo. Por receio, não o fiz antes. Sabe-se lá que receio era esse! Mas achei que já era hora de por a timidez de lado e expôr – mesmo que de forma metafórica na maioria das vezes – meus pensamentos. Visões, inspirações, ou seja lá outros "ões" que aqui se encaixam.
E cá estou eu. Não sou um primórdio da literatura, tampouco uma maravilha da modernidade, mas a gente faz o que pode, certo? O meu ponto de partida é compartilhar o que escrevo (ou o que tento escrever); sejam crônicas, contos, ou meu almoço do dia. Não, mentira, isso não (a não ser que dê - obrigada, Carol linda - em algo...). Bom, o que vem a partir daí, deixa que o tempo toma conta. E que sejam bons frutos!
Eu espero que gostem!
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